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| Tourada à corda ilha Terceira. imagem daqui |
Antes de mais quero deixar claro que sou contra touradas, que sou contra qualquer tipo de divertimento humano à custa do sofrimento animal.
Nestes últimos dias têm se levantado algumas polémicas a respeito de touradas. Primeiro por causa das fotos do João Moura Júnior, e também tenho visto no facebook de alguns amigos a história de uma senhora que tem um blog e uma página do facebook onde fala mal de touradas, mas esta senhora vai mais longe e ofende toda uma vila e a sua população pela prática de touradas.
Para quem não sabe, a ilha Terceira é a ilha mais taurina do país um dos locais que mais touradas pratica, sejam elas touradas de praça, sejam touradas à corda. Uma tradição antiquíssima que sem dúvida é uma das imagens de marca do povo terceirense. Eu, terceirense sou contra touradas de qualquer espécie.
Touradas de praça para mim são um evento de elites, onde as pessoas se aperaltam todas para ir ver um senhor cheio de “coragem” a espetar ferro num animal que está completamente fora do seu ambiente (e por isso desorientado), mas a coragem é tanta que o senhor está em cima de um cavalo. E depois vem o sangue e consequentemente as palmas. Uahhh.
Na Terceira acontece um fenómeno engraçado, existem pessoas completamente contra as touradas de praça “coitado do bicho a levar com ferros no lombo”, mas que depois são defensoras acérrimas da tourada à corda “ali ele está à sua vontade a correr pela rua, a corda não o magoa”. Até pode não magoar, até pode estar a correr, mas senhores, não livremente, que tudo o que aquele animal quer é fugir dali e por isso ele se põe a investir em tudo o que mexe, a ver se o deixam voltar para a tranquilidade do pasto.
Mas porque é que as pessoas da Terceira até podem condenar a tourada de praça, mas a maioria não condena a de corda? Qual é a diferença? A diferença é a tradição, a cultura.
Não me venham com moralismos de “então que raio de defensora és tu que chamas as touradas de cultura?” Sou, sou defensora dos animais, mas eu não tenho duas palas nos olhos e não vejo só para a frente que é o que normalmente acontece com os defensores dos animais. São tão cegos na sua causa, tão obstinados e tão, porque não admiti-lo, extremistas, que só vêem o que querem, e por isso a maior parte das vezes não são levados a sério e perdem a sua razão.
É preciso ver para além do sofrimento do animal, é preciso desligar por um segundo o interruptor que nos faz ter pena e respeito pela vida animal e olharmos em volta. Na Terceira estamos a falar de tradição, da ligação dos touros a um povo que os venera, que lhes agradece pelo facto de durante dois anos a ilha ter sido capital de um país que estava dominado pelos espanhóis (sim os touros deram uma sova nos Filipes). Estamos a falar de economia e de reconhecimento a nível internacional de uma ilha no meio do Atlântico. É preciso ver tudo isto. E sim, eu sou defensora dos animais, e sim, eu vou a touradas à corda na minha ilha. Se acho bonito ver um animal com dificuldades de respirar a ser capeado por pessoas no meio da rua? Não! Se acho bonito as pessoas abrirem a sua casa para qualquer um que queira entrar, terem uma mesa farta de comida e bebida para oferecer a amigos, contratarem uma filarmónica para ir animar uma tarde de touros em sua casa (em que o touro apenas passa à frente da sua porta)? Ai isso senhores, isso é bonito, e isso é uma marca, isso define o que é o povo da Terceira.
Se digo isso apenas porque sou de cá, e por isso é uma tradição minha e por isso eu a defendo?! Não! Primeiro porque não a defendo, respeito-a em tudo o que ela significa para este povo. Mas também respeito outras, porque tirei as palas dos olhos e fui conhecer outra tradição, e esta sim, é polémica até dizer chega. Falemos de Barrancos. E claro, falemos de touradas de morte. Touros de morte, os únicos legalizados em Portugal, e porque é que foram legalizados?! Pelos anos de tradição. “Lá vem ela tratar por tradição a chacina que todos os anos ali se pratica”. Antes de conhecer a vila era precisamente esta a minha opinião. Mas não basta vermos o que nos mostram na televisão, é preciso mais uma vez, ver para além do touro. E aliás, foi toda esta polémica levada pelos defensores dos animais que fez com que esta festa acabasse por ter ainda mais fama, ainda mais gente! É que depois de legalizadas, estas touradas deixaram de receber muitas das pessoas que lá iam nos chamados “anos de polémica”. Vamos ver, estamos a falar de uma vila, não de uma cidade, não de uma região, que é uma das vilas mais conhecidas do Alentejo (toda a gente já ouviu falar de Barrancos), que fica no cú de Judas, e que todos os anos recebe centenas de pessoas (acho que até posso arriscar nos milhares) que vão por estas touradas, mas que vão também pela música, pela alegria e pelo bem receber dos barranquenhos. Tal como na ilha Terceira, as touradas são apenas um terço da festa, o resto está nas pessoas. Eu, que já lá fui três anos, nunca, nunca pus um pé numa destas touradas, e podem ter a certeza, nunca o vou pôr. Porque eu respeito, mas eu não percebo. Porque eu respeito mas eu não gosto. Porque eu respeito, mas para mim aquele animal não merece tal “sorte”. E vamos falar na economia?! Nestes dias de festa (que nem chega a uma semana), muitos dos restaurantes, bares, hotel, residenciais ganham o suficiente para depois se poderem aguentar no resto do ano, onde a crise fala alto e o dinheiro é baixo.
Defender, não, nunca me vão ver a defender uma tourada, mas também nunca me vão ver no extremismo a que chegou a senhora de quem falava em cima, que no seu blog acha por bem chamar psicopatas a todo um povo pela sua tradição (quer eles vão ou não a estas touradas).
Quanto ao João Moura Júnior, desde que assisti à morte de um cavalo dele em plena praça, em plena corrida, sim, já fui a touradas de praça, não gosto, mas trabalhei numas quantas e por isso estive presente, “ahhh assassina, a ganhar dinheiro à custa do sofrimento de um animal”, como eu dizia, desde esse dia nunca mais consegui ter uma boa opinião a seu respeito. Na altura falou-se de que o cavalo estaria doente e que lhe foi injectada uma dose extra de qualquer coisa, não me lembro o quê, para que esse aguentasse a corrida, o resultado foi um ataque cardíaco em plena praça. Enfim, a história dos cães é lamentável, triste, se apoio, nunca, e aqui sim, também não encontro respeito para tal acto, não há tradição, não há economia, não há nada que o justifique.
Sei que este é um tema polémico, que muitos vão discordar, mesmo que não o digam, mas também acho que muito poderão ponderar um pouco sobre as suas acções. É muito fácil falar mal daquilo ou de quem não se conhece. E nada do que digam me poderá fazer pensar de outra forma. Esta é uma posição pensada, ponderada durante muitos anos. Isto de viver numa ilha onde há veneração ao touro e a touradas em todo o lado, e de ser defensora dos animais e do seu direito a uma vida digna é cá um pau de dois gumes, que me levou a muitas lutas interiores. Ouvindo, conhecendo e compreendendo consegui finalmente vincar a minha posição: compreendo, respeito, mas sobretudo, não concordo!

Fantástico texto.
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